CORREIO DO POVO
OSCAR BESSI
“ Brigada velha de guerra”. Ele se
referia assim, ao falar da corporação cuja farda vestiu por 34 anos. Era
o jeito como meu pai a definia.
E, em suas memórias, voltava o soldado
Bessi, incluído nas fileiras em 1946, ao largar a vida de cortador de
mato no esquecido Vapor Velho, depois de perder o pai e quase ter o pé
decepado por um machado, sem perder a vontade de fazer algo a mais na
vida. Jurou defender seu povo.
Na época, os jovens alemães, seus amigos
de infância no Vale do Caí, que sofriam perseguições do pós-guerra. Vejo
suas fotos em preto e branco que me deixou de herança, acampado em
rincões do pampa como São José dos Ausentes. Um menino e seu
compromisso. Como prender o desordeiro que espancava prostitutas para,
anos depois, reencontrá-lo prefeito de uma cidade. Que, formado,
conheceu os livros, em novembro, o mês em que nasceu, mês que seria da
Feira do Livro de Porto Alegre, que me ensinou a frequentar. Mês que
escolheu para deixar este mundo. Os livros o levaram a ser cabo,
sargento, oficial.
Quando comecei a escrever no Correio do Povo, falava
com carinho e orgulho do cabo Vito, pai do nosso Juremir, que adorava
ler. De sua vida ativa até a minha foram seis décadas de imersão nas
entrelinhas desta força policial quase bicentenária. Força que
sobreviveu às críticas, à politicagem, às forças contrárias e aos seus
próprios erros históricos.
Meu pai contava suas participações como
cavalariano no tumulto após a morte de Getúlio (que ele idolatrava igual
aos operários, mesmo com aquelas escorregadelas tirânicas), as
trincheiras da Legalidade, o asco que sentia em relação ao regime
militar. Contava-me sem papas na língua quem fez o quê. Só me pedia para
não repetir por aí, pois “tu não sabes do que essa gente é capaz”,
repetia, apavorado, no dia em que me viu com um bóton clandestino, no
tempo do governo Figueiredo. Os tempos mudavam, eu sabia. Mas meu pai
era gato escaldado.
A Brigada Militar de hoje conta outras histórias,
todos os dias, de novas guerras. De vidas que se salvam, de soldados
lutando contra o caos, sempre melhor armado, mas conseguindo vitórias,
mesmo que pareçam em vão ou resultem em pouco mais que nada. A farda
maltratada na cultura da impunidade, mas único fio de esperança em
instantes de desespero. O portal público de socorro 24h. Erros? Sim,
eles existem. Humanos erram todos os dias, em todos os lugares, e os
erros nos machucam. Enfim. Pobre humanidade, essa de trilhos
abandonados, destruições, agressões ao semelhante. Mas recheada de
heróis anônimos. A estes que peço um abra- ço. Os bons existem. E só
eles são capazes de se tornarem perenes.
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